sábado, 15 de maio de 2010

Humildade e gols: Jonas e Borges querem ser a melhor dupla do Brasil

Se vivessem de música, Jonas e Borges certamente não seriam parceiros. O primeiro é fã da moda sertaneja, enquanto o outro curte um hip hop evangélico. Sorte que escolheram jogar bola, de preferência para o fundo das redes. Tão diferentes e ao mesmo tempo absolutamente compatíveis. Em apenas cinco meses de trabalho no Grêmio, desenvolveram um entrosamento que os surpreendeu. Juntos, fizeram 35 gols nesta temporada. Estão entre os goleadores do país. Cada um ao seu estilo, todos os dias buscam fazer com que a sintonia só aumente. A torcida dos dois é para que assim seja por muito tempo. Querem ser a melhor dupla de ataque do Brasil.
 
Borges e Jonas, do Grêmio 
No Olímpico, palco onde têm brilhado pelo Grêmio, Jonas e Borges reforçam a parceria de sucesso
Funcionou muito bem no Campeonato Gaúcho, quando o time azul deu fim ao jejum de três anos sem dominar o Estadual e acabou campeão. Em breve, podem estar na decisão da Copa do Brasil, a porta mais próxima para que o clube volte à Libertadores da América. Falta um jogo, contra o Santos, semana que vem, na Vila Belmiro.
Na tarde desta sexta-feira, Jonas e Borges receberam a reportagem do GLOBOESPORTE.COM no gramado principal do Olímpico. Sentados no banco de reservas, local que praticamente não frequentaram nesta temporada, falaram durante meia-hora sobre o rápido entrosamento, as semelhanças nos momentos difíceis da carreira e a esperança de conquistar a competição nacional. Abaixo, confira os principais trechos da entrevista exclusiva.
O Jonas já falou várias vezes que vê em você o parceiro ideal. Quando veio para o Grêmio, imaginou que pudesse encontrar um jogador que desse tão certo com você?
Eu também estou dando a metade do bicho para ele, né? (risos). Claro que quando você vai para um novo clube, é difícil fazer previsão de como as coisas vão acontecer. Mas fico muito feliz porque já tive a felicidade de jogar com tantos atacantes e realmente nunca encontrei um parceiro que fizesse tantos gols junto comigo como o Jonas. Estamos nos dando muito bem dentro de campo, ele dando os passes que tem dado também fica muito fácil.
Nunca encontrou um parceiro com uma média de gols tão forte assim?
No São Paulo, em 2008, com o Adriano, ele foi embora no meio do ano. Com o Jonas, a média de gols que temos em cinco meses de trabalho realmente é muito boa. Não tem vaidade e isso tem feito com que o só o Grêmio ganhe.
Vocês sempre brigaram por artilharia na carreira. Percebe-se que aqui isso fica em segundo plano. Não é a prioridade de vocês?

Borges e Jonas, do Grêmio 
Briga pela artilharia fica em segundo plano
 
 
Jonas: Eu estou vivendo o melhor momento da carreira. Eu devo isso muito ao Borges, que é um grande jogador. Nem preciso ficar falando aqui. É um vencedor, é um campeão. Estar em campo e ter ele ao lado é importante, dá tranquilidade e confiança. Você sabe que pode contar com ele a hora que for preciso. Se encaixa muito bem nas minhas características, tem dado muito certo. Gosto muito de fazer as jogadas, deu para ver no jogo contra o Santos que eu sempre procuro por ele. É goleador nato. Espero que possa se prolongar até o fim do ano e até o tempo que ficarmos aqui porque estou muito feliz com essa parceria com ele.
Olhando de fora, percebemos a facilidade de vocês na hora de fazer tabelas. Pela qualidade da infiltração do Jonas e pelo teu bom pivô. Vocês percebem isso em campo também?
O Jonas, além de cair mais pelos lados do campo, consegue chegar muito rápido ao gol e tem a qualidade de finalizar bem também. Geralmente quando você joga com um atacante que só joga do lado, não tem a tendência de fazer muitos gols porque ele tem mais a característica do drible, da assistência. Como o Jonas chega bem, sei que posso pegar a bola de costas e escorar para quem vem de trás. Aí fica fácil para finalizar.
É difícil acontecer um entrosamento tão rápido?
É muito pouco tempo de trabalho. Geralmente acontece com mais tempo. Pela sequência de jogos e da maneira como temos jogado, não sei como está hoje em relação ao país, mas é uma dupla de ataque que vem fazendo muitos gols, média muito boa. Acredito que ela possa crescer mais. Temos a esperança de jogar sem lesões, que às vezes prejudicam uma sequência boa do atleta. Queremos jogar juntos um longo ano e quem sabe o Grêmio possa ter uma dupla de ataque das maiores de todos os tempos.
Jonas: O período é bem curto e um encaixa bem com o outro. A quantidade de gols que fizemos é visível. Joguei com vários jogadores na minha carreira e tenho muita felicidade de poder jogar com um parceiro como ele.
Uma das contratações mais batalhadas pelo Grêmio foi o Leandro. Ele tem feito um papel de articulador do meio-campo. Quando o Leandro chegou, dizia-se que o Jonas fez uma ótima temporada, mas o Leandro estava chegando para ser titular. Você achava que seria o companheiro de ataque do Borges ou imaginava que seria o Leandro?
Sabemos que num clube grande a disputa é enorme, vários jogadores de qualidade. No atual grupo do Grêmio, são pelo menos dois bons jogadores por posição. Com a chegada desses reforços você fica pensativo, não sabe se vai começar a temporada como titular, mas isso é só com o trabalho. Comecei o ano com a intenção de ser titular, de ajudar o Grêmio com gols. Por isso que eu foquei nisso e até agora tem dado certo. É bom ter um grupo de qualidade para você não relaxar e quem ganha é o Grêmio.
Borges, você disse que o São Paulo queria que você ficasse no fim do ano passado, mas você viu que era a hora de buscar novos ares, render mais, ser mais valorizado. Se sente muito mais valorizado no Grêmio?

Jonas e borges, jogadores do grêmio 
Atacantes têm ajudado o time a justificar a fama de
imortal.
Eu vejo a situação do Jonas, que graças a Deus mudou, mas era parecida com a minha. Você terminar uma temporada como artilheiro e no outro ano ser colocado sempre como um jogador em dúvida para ser titular é algo que mexe. Todo atleta profissional faz um trabalho e espera o reconhecimento. Nos três anos que estive no São Paulo, fiz 54 gols e, principalmente pelo ano de 2008, quando eu fui artilheiro da equipe, fui campeão, decisivo, ganhei vários prêmios individuais. Você chegar no outro ano e estar sempre brigando para ser titular, chega um momento que fica muito cansativo. Às vezes é melhor pensar: “estou num grande clube, mas eu preciso ver o meu lado profissional”. Pensei em mudar justamente por causa disso. Não me sentia confortável para continuar no São Paulo. Tinha a convicção de que se continuasse lá ficaria sempre na mesma situação, jogaria uma partida e outra não. Precisava de uma sequênia. É o que está acontecendo com o Jonas. Neste ano, tem a confiança do treinador e do grupo e está conseguindo desenvolver o trabalho. Muitos que pensavam que ele iria sair, como havia especulação no início da temporada, o veem como jogador decisivo. Porque ele tem tido sequência e competência para mostrar seu trabalho. Nisso sou grato ao Grêmio. Quando me procuraram, me deram esta confiança para trabalhar, a oportunidade. Procuro fazer o melhor para que as coisas possam acontecer. Fico feliz porque estão acontecendo.
Outra situação muito parecida entre vocês. O Jonas, no ano passado, brigava para ser artilheiro do Brasileirão e se machucou. O Gauchão não tem o mesmo peso do Brasileirão, mas você tinha tudo para ser o goleador e se machucou. Bate uma raiva no jogador por isso?
Bate, cara. Não é nem pelo fato da artilharia, mas pelo momento que eu vinha vivendo. Vinha numa sequência muito boa, não tinha uma lesão muscular há três anos. Eu me cuido bastante para não ter lesão. Não perco noite, sou bem concentrado. Vinha fazendo gols e queria muito participar do segundo turno e fiquei fora até mais do que eu esperava, foram 47 dias sem jogar. Me prejudica bastante saber que os companheiros estão jogando e não posso ajudar. Não é fácil. Só minha esposa mesmo para aguentar. Tinha dias que dava vontade até de quebrar a televisão. Não é fácil. Imagino como estão Souza, Lúcio, William, jogadores importantes que estão sem jogar, em recuperação. O mais importante é ter a consciência de que quando voltar vai fazer melhor.
Para você foi muito frustrante, Jonas?
Com certeza. A artilharia é uma conseqüência do seu trabalho. Você vem num bom momento e parar por lesão é complicado. Você fica bem triste. Ali, praticamente acabou o ano para mim. Sabia que ia ficar um mês e meio, dois meses, e voltaria faltando duas ou três rodadas. Não ia poder fazer gols, ajudar o time dentro de campo. Isso abala muito.
Na última quarta-feira deu para ver o quanto vocês foram decisivos na vitória sobre o Santos (4 a 3, no primeiro jogo da semifinal da Copa do Brasil). Como é carregar tanta responsabilidade?

É sinal de que eles (torcedores) têm a confiança nos atletas que têm feito um grande trabalho. Ficaria triste se viesse jogar e a torcida mandasse me tirar. Saber que o torcedor tem uma expectativa nos motiva ainda mais a trabalhar. Eles sabem que têm jogadores de qualidade e que procuram fazer o máximo pelo clube.
Jonas: Verdade. Eu li em algum lugar na internet que um torcedor dizia que seria 2 a 0 contra o Santos com um gol do Borges e outro do Jonas. Você fica feliz por saber disso.
Como você define o Borges, Jonas?
O Borges é uma excelente pessoa. Eu me espelho muito nele, porque é mais experiente e vencedor. Passou por um grande clube antes de chegar a um grande clube que é o Grêmio, teve muitas conquistas. É conhecido no Brasil e no mundo porque mostra suas qualidades dentro do campo. Fora de campo é uma pessoa centrada, que busca Deus. É importante para todos os jovens, eu já estou numa outra idade, mas jogadores como o Mithyuê, o Maylson, que estão começando e precisam se inspirar nele (E em você, né? – interrompe Borges). É um vencedor. Fora daqui não nos reunimos muito, mas nos concentramos no trabalho. Eu estou muito feliz por esta parceria. Meu melhor momento aqui no Grêmio está sendo ao lado dele.
Deu moral para você, hein?
Por isso que eu dou metade do bicho para ele (risos). O Jonas é um cara bastante divertido, um cara alegre, que está sempre feliz. Sinto isso todos os dias. Contagia o grupo com a maneira dele de ser. É muito simples, brinca com todo mundo, treina bastante. Fico feliz por nosso relacionamento fora de campo ser bom também. Num grupo com tantos atletas é difícil acontecer. Está sendo muito prazeroso trabalhar com um cara como ele. Ainda mais para mim, que venho de outro clube, a adaptação é mais difícil. Ele também serve de inspiração para os mais jovens. Que o nosso sucesso continue a acontecer. O que marca a carreira do atleta são títulos. A três anos o Grêmio não era campeão gaúcho e já conseguimos isso. Que a gente possa ganhar essa Copa do Brasil, que é o que mais queremos.
De quem é a iniciativa das dancinhas na comemoração?

Jonas e borges, jogadores do grêmio 
Jonas e Borges se divertem durante a entrevista
 
(Borges aponta para Jonas e sorri). Jonas é evangélico, então às vezes ele fica meio retraído (risos). Mas eu gosto. Dentro de campo sou bem extrovertido. O gol é momento de alegria. Mas no jogo contra o Santos ele dançou hip hop por conta de uma banda evangélica que ele gosta e eu fui logo junto, imitando ele. Eu sou mais sertanejo.
É hip hop e sertanejo?
Borges: Futebol alegria, cara. Isso é o gostoso, o bonito do futebol é quando o atleta vai para campo e vai feliz. O futebol proporciona o reconhecimento de todos na rua. Proporciona morar em outro país, conhecer outra cultura. Quando você entra num estádio lotado e sabe que é um ídolo para uma criança, para muitas pessoas, dá muito orgulho.
Acha que formam hoje a melhor dupla de ataque do Brasil?
Com os bons resultados e os gols que têm saído, estamos entre umas das melhores. Mas dizer que é a melhor seria muita pretensão. Pelos gols importantes, pelos números, diria que estamos entre as cinco melhores do país.
Jonas: Fazemos o nosso trabalho focados. Estamos fazendo um boa dupla no futebol brasileiro, existem várias outras. Estamos felizes por estar entre elas. É gratificante para nós e para o pessoal do Grêmio também.
Borges, você disse algumas vezes que não tinha grife no São Paulo. Expressão que o Hugo, que jogou lá, usou aqui também. Pelo que você está fazendo, espera fechar a temporada com a grife merecida?
Ouvi a palavra grife pela primeira vez do próprio Marco Aurélio Cunha (superintendente de futebol do São Paulo). Quando o São Paulo foi pentacampeão brasileiro em 2007, ele falou no DVD que o André Dias não tinha a grife do Miranda. Com a experiência você vai aprendendo essas coisas e vai refletindo. Acredito que alguns jogadores chegam com um peso a mais que outros. Isso é normal, pelo que conquistou. Mas é uma outra história. O São Paulo faz parte do meu passado, vivi momentos muito bons lá, maravilhosos. Entrei para a história daquele clube com dois títulos brasileiros. Só quero lembrar as coisas boas, estou muito feliz no Grêmio pelo reconhecimento da torcida e dos companheiros.
Essa dupla não desafina?
Borges: Estamos concentrados. Futebol muda muito. De uma hora para outra o cara que era bom pode ser tornar ruim. Tem de ter equilíbrio. Se as coisas estiverem boas, vamos trabalhar mais. Se ficarem ruins, vamos trabalhar mais ainda. Este é o segredo. Jonas já viveu histórias boas e difíceis no futebol, assim como eu. Fazem com que você amadureça e não caia em ciladas.
Jonas: Antes do jogo contra o Santos, para não cansar o grupo, o Silas faz o rachão. O Borges e eu ficamos fora para treinar finalizações. Deu resultado e foi visível dentro de campo. Ele fez três gols e eu fiz um. Estamos trabalhando, conversando. É trabalhar com humildade, seriedade. Sempre achar que pode melhorar.

Fonte: Globo.com
Marivaldo Lima

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