domingo, 16 de maio de 2010

Lippi quer Itália jogando todos os jogos como se fosse contra o Brasil

Lippi técnico da Azurra

 A série de reportagens "Os Superfavoritos da Copa" começou neste domingo falando sobre a Itália . Marcello Lippi, treinador da Azzurra para a Copa de 2010,  concedeu entrevista exclusiva, que você confere na íntegra a seguir.

Quais são as principais qualidades da seleção italiana na busca pelo pentacampeonato?
Para vencer o Mundial, a Itália deve ter os mesmos pressupostos psicológicos que teve a seleção da Copa de 2006 e as mesmas qualidades técnicas, que, mais ou menos, esta seleção de 2010 terá. É o que desejamos, porque a grande incógnita do Mundial são os infortúnios. Esperamos não ter esses infortúnios... Entretanto, não acredito que estaremos carentes do ponto de vista técnico. Ou seja, precisamos ter os mesmos pressupostos psicológicos, as mesmas qualidades morais, a mesma integridade, a mesma solidez, a mesma unidade de objetivos que tivemos no último Mundial. E tomara que tenhamos a mesma sorte que tivemos e de que precisamos nos momentos importantes.

Somente o Brasil e a Itália venceram dois mundiais consecutivos. Fica mais difícil conquistar o título sendo a atual campeã?
Penso que sim. Aquilo que é difícil ou fácil na história do futebol vem documentado no que aconteceu em tantos anos. Ou seja, em cem anos de história do futebol, aconteceu só duas vezes, em 1934 e 1938. E é o único caso na história do futebol que um treinador (Vittorio Pozzo) venceu duas vezes consecutivas. E depois venceu o Brasil, mas com outro técnico (em 1958, com Vicente Feola, e em 1962, com Aymoré Moreira). Evidentemente, não é uma coisa muito simples. Aconteceu só duas vezes. Porque faz parte da natureza humana. Eu imagino que os brasileiros estarão muito motivados, da última vez que perderam o Mundial sabiam que eram a seleção mais forte do mundo. E sabem que perderam porque, evidentemente, aconteceu alguma coisa que os levou a render muito menos do que podiam. E por isso sabem... Por que são os superfavoritos? Porque são os mais fortes e estão supermotivados. Essa é uma característica que leva os brasileiros a serem os protagonistas.

Você convocaria o Ronaldinho Gaúcho?
Até o Ronaldinho querem me dar agora! Já tenho outros nomes com os quais devo me preocupar. Todos os países têm os seus tormentones (aquelas músicas de sucesso que enchem a paciência dos ouvintes), digamos assim. São jogadores bem vistos pela opinião pública e por jornalistas que ficam fazendo propaganda deles constantemente, durante todo o ano. Na Itália, tivemos o Cassano, depois Balotelli... No Brasil, tem Ronaldinho e outros. Há técnicos que fazem suas escolhas com raciocínio e critério, com motivação exclusivamente ligada à construção de um grupo importante, que tenha os pressupostos técnicos e psicológicos para poder vencer. O jogo é assim. É normal que certos nomes sejam pedidos e é normal que o técnico faça aquilo que tem na cabeça.
Ronaldinho é um jogador extremamente talentoso, assim como são talentosos Balotelli e Cassano. Isso não significa, necessariamente, que os técnicos das seleções devam convocá-los. Não diria, como tantos outros colegas, "se fosse eu, o convocaria". Nunca diria. Porque, para fazer uma convocação é preciso entender que coisa se pretende fazer. Por isso, eu jamais diria de fora "convocaria aquele jogador". É a coisa mais errada que pode fazer uma pessoa. A mais incorreta.

A defesa foi um ponto decisivo da seleção italiana de 2006. Essa vai ser novamente a base da característica da Azzurra?
A defesa é a base de todas as seleções, não apenas da italiana. Se não tem uma defesa... dificilmente, se vê uma seleção que não se preocupa com a defesa e só com a fase ofensiva e vence alguma coisa, muito dificilmente. Um exemplo disso é a seleção de vocês, que se tornou muito europeizada no último quadriênio, desde quando entrou o Dunga. E, por isso, tornou-se a seleção mais forte que existe.

Uma eventual convocação de Balotelli não poderia ser um marco no combate ao preconceito racial na Itália?
Todos sabem que eu sou contra qualquer tipo de racismo. Para mim, existe uma raça só no mundo, que é a humana. Eu sou contra qualquer tipo de racismo, de pele, de cultura, de todo o tipo. Mas também sou convicto de que um técnico não pode fazer uma convocação por este motivo. Balotelli joga tranquilamente na sub-21, assim como Okaka e Ogbonna. Tinha três rapazes negros na sub-21. Eu convoquei no passado jogadores negros, como Santacroce, do Napoli. Não tenho nenhum preconceito. Quando eu julgar oportuno convocar o Balotelli, eu o farei. Só e exclusivamente por questões técnicas. Não por outras.
Sobre Balotelli, eu já falei um bilhão e setecentas vezes, mas falo de novo. Balotelli é um rapaz que, seguramente, tem um grande talento e estou seguro, certo, de que, quando ele tiver completado o percurso de maturação no Inter, poderá ser util à seleção. Mas, agora, me parece que até mesmo no Inter ele não vem mostrando isso. Ou não?

Muitos torcedores dizem a seleção italiana está muito envelhecida e que falta renovação. O que o senhor acha disso?
Se eu devesse inscrever esta seleção para um campeonato que dura um ano, provavelmente, teria outros critérios. Mas, como esse campeonato dura um mês, não tem problema de idade. Tendo 32, 31, 28, 27 ou 21 anos. Quando se coloca no prato da balança a qualidade de um jogador, não se observa somente a idade e a qualidade técnica. Observa-se a experiência, o carisma, a familiaridade com eventos internacionais. A capacidade de reagir rápido à dificuldade de uma partida, de um momento, de um ambiente. Pesa-se tudo isso junto. Em um mês, um jogador com 34, 35 anos pode ser mais importante que um de 24 ou 25.
E um jogador como Cassano?
Cassano, Cassano...? Me foge quem é esse.

E o grupo da Itália na fase inicial, está mais fácil desta vez?
Toda ocasião, antes de uma Copa, em qualquer parte do mundo que você pergunte quem são os favoritos, todo o mundo dirá sempre ‘Brasil’. ‘Quem vence o Mundial? Brasil’. Depois, agora, boa parte do mundo dirá ‘Brasil e Espanha’, porque a Espanha está atravessando um momento muito bom, venceu a Eurocopa, tem auto-estima, motivação. Depois, são cinco ou seis seleções: Inglaterra, Alemanha, Itália, França e Holanda, que, quando vão ao Mundial, não vão pra fazer bonito, mas para ganhar. E podem vencer. Isso que eu estou dizendo aconteceu na Alemanha. Para onde você fosse, diziam sempre ‘Brasil, Brasil...’, porque tinha vencido a Copa das Confederações, e tinha feito três, quatro gols em todos, até na Argentina. Todos diziam isso. Mas o Brasil foi para casa nas oitavas e a Itália ganhou. Venceu uma destas quatro ou cinco seleções que quando vão estão dispostas a vencer, não só pra participar. Digo isso porque, se fosse considerar fácil o nosso grupo... Se a Itália considerar fácil jogar contra seleções como a da Nova Zelândia ou Eslováquia estará cometendo um grande erro. Da mesma forma, a Inglaterra não pode achar que será fácil jogar contra a Argélia. Nos mundiais, esses erros não podem ser cometidos. Na Copa, todas as partidas devem ser jogadas como se fossem contra o Brasil, ou seja, contra a melhor seleção do mundo.

Fonte: Globo.com
Marivaldo Lima

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário